sábado, 13 de dezembro de 2008

Diários de Cocotaxi - Dois brasileiros em Cuba - Parte II

Acredite: essa foto foi tirada em troca de 3 xampus

Havana: uma rica pobreza

Saímos de Varadero contaminados com o pior do capitalismo: o desperdício, o luxo totalmente desigual e abundância exagerada. Logicamente que lembrávamos o país onde estávamos, mas é fácil esquecer de questões sociais quando a média de piñas coladas ao dia era de 15 - eu disse a média.

Não demorou muito para o cenário mudar. E menos ainda para sacarmos nossas câmeras digitais - ou, no meu caso, o celular. Havana é um cartão postal 24h. Qualquer esquina possui um atrativo para fotógrafos - amadores ou profissionais. A cidade mescla um colorido vivo com um cinza pobre, tudo isso somado a um cenário tipicamente tropical. Salsa tocando o tempo todo, pessoas de chapéus panamá e palmeiras fazem você ter vontade de registrar tudo e dá a impressão de que você está dentro de um videogame. Mas é tudo real.

A vista do nosso hotel em Havana (clique para ampliar): uma ilha
capitalista em meio à pobreza


E a realidade do cubano não é fácil. Com um salário médio de 15 pesos, eles dependem do turismo para complementar suas rendas. Um quilo de carne custa 11 pesos, portanto, é possível imaginar o quanto eles admiram dinheiro vindo de visitantes. Até pouco tempo, moradores do país não podiam comprar microondas, DVDs ou itens secundários. A única maneira era os trazendo de fora. Porém, são poucos os que podem sair do país. Apenas médicos, artistas ou esportistas, além de pessoas ligadas ao governo, claro, podem viajar para fora de Cuba.

A terra dos contrastes, Havana é absolutamente única

A saúde em Cuba é sempre motivo de orgulho no país. Junto com a educação, são dois benefícios gratuitos aos cidadãos. A mortalidade infantil é menor do que nos Estados Unidos. Mesmo assim, estima-se que atualmente 31 mil médicos de Cuba trabalhem fora do país. Em cuba, é possível conseguir agendar - e fazer - uma ressonância magnética em questão de minutos.

Fidel y El Che| A adoração ao "nuestro comandante" Fidel Castro é latente. Seja por meio de cartazes e placas ou ao conversar com a população mesmo. Um cubano diz, até com um certo orgulho, que ninguém sabe onde está Fidel. "Ele vive escondido por questões de segurança", explica. Segundo suas razões, Fidel já foi vítima de exatos 637 tentativas de homicídio por parte da CIA, órgão de segurança do governo dos Estados Unidos. "E estão todas documentadas", complementa.

Fidel não está sozinho na lista de heróis cubanos. Junto dele, José Martín também é bastante citado como um dos responsáveis pela revolução de 1959 que tirou Fulgêncio Batista do poder. Porém, os dois são superados de longe por um nome que tem imagem quase tão conhecida como Jesus Cristo: Ernesto Che Guevara.

"El" Che está presente em praticamente toda esquina de Havana. Quando não é seu famoso rosto acompanhado da boina e da estrela, são suas frases famosas ou cartões postais com fotos inusitadas, como o argentino (sim, Che nasceu na Argentina) fazendo a barba ou ocioso em um sofá. Nas eternas feiras de artesanato, ele é, de longe, o mais representado. A foto de Che está em camisetas, quadros, caixas de charutos, ímãs e onde mais imaginar - basta lembrar que, em 2007, Gisele Bündchen desfilou com o rosto do revolucionário em seu biquíni (um dos maiores antagonismos possíveis, aliás).

O maior rosto de Che em Cuba está no Instituto de Educação em Havana, na Praça da Revolução. Ele próprio costumava frequentar o prédio para estudar. Em sua homenagem, o imenso semblante famoso, seguido da frase "hasta la vitoria sempre". O tamanho impressiona, e também dá a noção exata do quanto esta pessoa de gestos questionáveis ganhou uma fama que ultrapassa facilmente o que ele representou em vida.

Quer distância dos heróis de Cuba pela TV? Esqueça.

A televisão de Cuba se resume a três canais. O canal oficial do estado e dois canais educacionais. Em ambos, não há intervalos comerciais com propagandas consumistas. Apenas mensagens de apoio ao governo e lembretes de que, em janeiro próximo, comemoram-se 50 anos "de la revolución".

"Chaves" o dia inteiro? | Assistir a TV em Havana é uma árdua tarefa. Durante boa parte do dia, desfiles e homenagens militares tomam espaço da programação. Os telejornais são um capítulo à parte: matérias sobre visitas e agenda do atual comandante do país, Raúl Castro, levam quase meia hora. As cenas do que ele fez no dia vão ao ar de forma bruta, quase sem edição. Discursos são exibidos quase na íntegra. Uma das cenas me chamou a atenção em especial: mostrava uma pequena garota, com não mais que 11 ou 12 anos, entregando uma carta dirigida à Fidel ao irmão Raúl. Ao passar a carta, apenas disse "espero que nosso comandante se recupere logo", caindo então em prantos. Chocante.

A TV que tínhamos no hotel, logicamente, possuía alguns outros canais com aspecto mais global. Um deles foi fenomenal: a TV Venezuela. Foi outro susto ver, de forma mais próxima, o que acontece com Hugo Chávez por lá. Não é difícil imaginar que ele pretende ser um novo Fidel. O canal possui mais intervalos do que programação. Neles, são exibidos clipes de músicas feitas especialmente para apoiar Chávez. Rock, salsa, bolero... É uma espécie de MTV comunista. Entre um solo de guitarra e outro, entravam trechos de discursos do presidente da Venezuela, em especial repetindo a frase "Uh ah, Chávez no se vá". Assustador e instigante ao mesmo tempo.

Quer saber mais? Aguarde outro post. O texto já está muito grande...


Terminando o primeiro puro: Era apenas a primeira noite em Havana

Um comentário:

Anônimo disse...

Lindas fotos, imagino que a viagem tenha sido uma viagem... em muitos sentidos.